Quando eu era
criança chegava na casa de minha avó materna e ia logo dizendo:
Vovó! Vou adivinhar o que a senhora comeu hoje!
Claro que ela me
olhava com aquele ar de quem acha que a neta é esquisita, mas entrava na
brincadeira.
Diz!
Laranja, feijão e bala
de café, eu respondia animada.
Acertou! Como você
sabe?
Eu tinha aprendido
o jogo de adivinhação com minha mãe.
Todas as vezes que
minha mãe a encontrava ficava doida com a sujeira acumulada nos óculos, sempre
pendurados no pescoço.
Eram restinhos de
coisas que vovó tinha lambiscado ao longo do dia e, na pressa, deixado cair, em
migalhas, nas lentes dos óculos.
Ou seja, vovó
nunca usava os óculos e ainda por cima era muito distraída e babona!
Ela resolvia o
assunto espanando a sujeira, exclamando um “pronto” de quem acha que esse é o
menor dos problemas. As lentes estavam
sempre ensebadas e embaçadas. Mesmo
assim ela cozinhava, costurava, fazia tricô e crochê com perfeição.
Concluo que vovó
não precisava de óculos e gostava de ter um babador moderno.
Eu acho que meus netos farão a mesma coisa comigo.
A diferença é que
ao invés dos óculos, usarão o meu celular, notebook e similares como
fornecedores de pistas.
Vovó! Vou adivinhar o que a senhora fez hoje.
Diz!
A senhora picou
papel, fumou, comeu bolo e tirou pó da casa – menos do computador!
Como você sabe?
Ah! E a senhora fez carne engordurada e depois
falou com a minha mãe pelo whats!
E...Vovó! a
senhora mexeu com gliter hoje?
Que esperteza!!!!
Duvido que haja
alguém na face desta terra que use esses apetrechos e não os suje.
Impossível!
Você pode até
caprichar, lavando sempre as mãos e deixando tudo bem longe de você, por
precaução e conhecimento de sua característica desastrada, mas aí vem um amigo
ou um parente e pimba! - goteja alguma
coisa, derruba outras ou simplesmente usa os seus apetrechos com as mãos cheias
de creme, óleo ou estreptococos in natura mesmo.
E fiquei pensando
que se tivermos o fim da humanidade e Ets nos descobrirem daqui a milhões de
anos, espero que não encontrem esses equipamentos e os usem como objeto de
estudo de comportamentos. Seria uma grande confusão!
A definição deles
sobre os equipamentos seria, provavelmente, “algo em que essa espécie desaparecida
utilizava para refeições, comunicação e entretenimento já que apertar teclas
parece ter sido uma das atividades mais praticadas em suas vidas”.
E tentando
aprofundar o assunto, os Ets poderiam concluir: “Pelas evidências encontradas,
parece que era uma espécie comilona e solitária, provavelmente com membros atrofiados
e cabeças gigantescas. Seus cérebros ficavam
constantemente conectados a esses estranhos aparelhos”.
Ou, com uma
previsão de*, em 2019, ter mais aparelhos que gente, a Terra talvez fosse
considerada por eles um planeta cuja espécie dominante era a de gulosos
aparelhos eletrônicos e, os humanos, apenas seres simbióticos – acoplados e
depedentes dos aparelhos que teriam reinado sobre todas as outras espécies.
Um ou outro Et contestaria
essa teoria, claro. Mas seriam desconsiderados no meio científico, dadas as
evidências encontradas nos vãozinhos dos apetrechos eletrônicos.
- 2019 haverá 7,6 bilhões de assinaturas de banda larga
- Previsão da Ericsson que supõe o
uso de, pelo menos 1 aparelho para cada linha),